A secretária de Cultura do município do Rio de Janeiro, Nilcemar Nogueira recebeu o Site CARNAVALESCO
para uma entrevista exclusiva na quinta-feira da semana passada e
abordou diversos temas importantes e polêmicos para o carnaval e para o
samba. O principal ponto foi a iniciativa da secretária em acolher para o
Carnaval 2019 todas escolas da Lierj e da Liesb na pasta de Cultura, ou
seja, o orçamento do Acesso sairia do chapéu da Riotur. Leia abaixo
todos os detalhes da conversa realizada no prédio administrativo da
Prefeitura do Rio de Janeiro.
AJUDA PARA ESCOLAS DO GRUPO DE ACESSO
“As escolas podem ser fomentadas de diversas formas. Todo secretário
entra com um orçamento. O das escolas de samba não está na pasta da
Cultura, mas na Riotur. A mudança é uma construção. Eu teria R$ 15
milhões para fomentar a cultura da cidade toda o ano inteiro, mas só
tive a metade. Há um pacto a ser feito com as escolas para que a gente
construa essa conversa de reforçar o papel delas enquanto lugar de
transmissão, inclusive, para cada escola ter uma agenda permanente o ano
todo para ajudar na hora de fazer seu carnaval. Assumo esse compromisso
de pensar em como estruturar esse samba e que ele saia dessa corrente.
As escolas vivem da carta de crédito do outro ano. Não conseguem se
mexer para nada. É preciso criar um caminho de sobrevivência e através
disso ir se estruturando. Todo dia penso em como socorrer agora, mas
tenho o impeditivo de não ter o orçamento para o ano que vem, porque o
pacto ainda não foi feito, eles ainda estão na Riotur. Tenho que fazer o
estudo de remanejamento e sentar para essa negociação em janeiro, caso
as escolas tenham tempo, ou imediatamente no pós-carnaval. Vamos fazer
juntos esse desenho. Acho viável acertar com o prefeito e a Riotur para
eles aceitarem essa mudança. Se as escolas quiserem estou super dentro
dessa reconstrução com eles. É uma mudança de paradigma para as escolas
do Grupo de Acesso (Lierj e Liesb)”.
APOIO IMEDIATO AO GRUPO DE ACESSO
“Vamos oferecer os eventos no Terreirão com os shows da
Alcione, Xande de Pilares, entre outros, e que a renda dos ingressos
seja das escolas da Lierj e da Liesb. Temos que pensar rápido. Alguns
vícios tem que ser desconstruídos. No Acesso, as pessoas querem ganhar
roupa. Antes, as pessoas faziam suas roupas. É um novo momento. Temos
que ter uma conversa em que todos precisam entrar na roda, ninguém vai
ser o Cristo da salvação. É preciso entrar agora nesse momento e pensar
em como refazer. Antes era um processo de construção coletiva. Não me
satisfaz eu chegar em uma quadra e ver um baluarte mal posicionado e um
visitante de ocasião estar posicionado numa zona de conforto e que nunca
mais vai aparecer lá. São inversões de valores que precisam ser
resgatadas”.
RELIGIÃO DO PREFEITO E PERSEGUIÇÃO AO CARNAVAL
“Eu sinto zero de perseguição religiosa. Até hoje minha relação foi
com o prefeito gestor, nunca tive relação aqui dentro com o prefeito
pastor. Isso pode ser comprovado com a minha agenda na secretaria. Tive
um mês inteiro da diversidade, 16 pautas gays, fomentei e dei apoio para
pautas de matriz africana. Novembro todo foi de matriz africana. E
nunca ouvi isso não pode. Viemos de um prefeito que era carnavalesco,
mas porque o samba está sem estrutura? O prefeito é evangélico, mas é um
gestor. Eu lido com ele. Na minha mesa tem uma imagem de santa e ele
vem aqui e não reclama. Por ele tem que fingir que é evangélico? Ser
carnavalesco é botar um chapéu panamá e dançar? Eu prefiro um prefeito
evangélico que queira reestruturar o samba”.
POLÊMICA DA ENTREGA DA CHAVE DA CIDADE PARA A CORTE CARNAVALESCA
“A entrega da chave para o Carnaval 2018 acontecerá. O meu desejo é
que seja feita no Terreirão do Samba, mas ainda não levei essa pauta
para o prefeito. Em 2017, a entrega estava prevista e o prefeito iria
fazer no Sambódromo. Eu posso dar a minha palavra disso. Estávamos
juntos aqui na prefeitura. Naquele dia a esposa do prefeito piorou de um
problema de saúde e ele teve que ir para o hospital. Ela estava com
pneumonia. É só conferir o boletim do hospital do dia por volta das 19
horas. Ele me pediu para fazer a entrega da chave, mas nem perguntei se
podia entrar em detalhes da motivação dele não ter ido. O problema foi
que ele não confirmou antes que iria entregar a chave”.
INCENTIVO AO SAMBA E AO CARNAVAL
“A escola de samba não é só fazer o seu ensaio comercial para ter o
fomento. A escola era o lugar de transmissão do samba. Era a maior
garantia da salvaguarda de um bem que hoje é patrimônio cultural do
Brasil. Hoje, a transmissão está ameaçada, porque a escola de samba
deixou de fazer seu papel. A família frequentava, tinha a questão da
comida das escolas de samba, as crianças se identificavam e queriam
estar na bateria. As quadras das escolas não tem mais o seu povo e foram
perdendo público, porque as pessoas iam para ver esse povo. A escola
foi perdendo o seu sentido. Eu já disse para o presidente da Liesa: ‘o
sambista é a alma desse negócio. Hoje, nós temos um corpo no
desfibrilador, quase morto. Ele pode sobreviver. É só ouvir os
sambistas, é fácil”.
CADÊ O CARNAVAL NO ORÇAMENTO DA CULTURA?
“Tivemos 6 milhões de pessoas na agenda cultural da Prefeitura do
Rio. Abrimos três editais e nenhuma escola de samba se inscreveu. Será
que quem dirige escola de samba hoje sabe o que é escola de samba (ao pé
da letra)? Tive um ano de austeridade, mas que não me privei de ter
opções artísticas e culturais. Não fechei nenhum equipamento cultural.
Fiz gestão. Esse espaços geram receita pequena. Por isso, a importância
da presença do poder público”.
ACUSAÇÃO DE NÃO AJUDAR OS SAMBISTAS E ESCOLAS DE SAMBA
Foto: Berg Silva
“De qual lado do samba estamos falando? Reproduziram uma fala sem
pensar, mas isso não me abala. A minha preocupação é com os sambistas.
Infelizmente, quem cuida do espetáculo é a Riotur, porque eu repito que
gostaria que fosse a secretaria de Cultura. A conversa da Riotur com a
Liesa para resolver a questão da verba se deu a partir de um empurrão
meu quando estava preocupada com o calendário, vendo a proximidade do
carnaval, e não sabia o cenário. Fui até o presidente da Riotur para
oferecer ajuda e a sensibilização de ter a conversa. E sai de cena,
porque não era mais da minha alçada. No meu sentimento estou com
sambista pelo seu empoderamento, estou com o ritmista, a porta-bandeira,
a velha-guarda, a criança. Eles podem sempre contar comigo. Sou
ativista de carteirinha assinada em prol do samba. Está no meu DNA. As
pessoas entenderam que essa pauta da verba do carnaval, infelizmente,
não é minha. A receita para resolver é muito simples e barata: faça uma
plenária e ouça o sambista”.
SAMBA PATRIMÔNIO DO BRASIL

RELAÇÃO DO CARIOCA COM O CARNAVAL
“O carioca é apaixonado pelo samba e carnaval, mas não conhece. Para
fazer somente o entretenimento não precisa de mim, porque o dinheiro
público tem que levar desenvolvimento. O desafio é desconstruir o
pensamento que a Prefeitura do Rio fazia esse aporte por entretenimento.
O fomento é para dar ajuda para plantar a semente e a partir daí
caminhar com as próprias pernas. É preciso ter a contrapartida social.
Os enredos poderiam ser explicados em escolas públicas. Imagina ter o
samba fomentado 12 meses na cidade. Quantos empregos gerados? Quantos
turistas vamos ter?”.
CULTURA NO RIO DE JANEIRO
“Na minha gestão, a primeira coisa foi pensar nos eixos estratégicos
da política cultural da cidade. Um deles é a memória. O Rio de Janeiro
sempre trabalhou mal o seu principal ativo cultural. A cidade tem dois
atrativos para o turismo: a beleza natural e o atrativo cultural. Existe
uma barreira a ser rompida que é o preconceito cultural. A minha gestão
é participativa. Fui muito para rua para ouvir as pessoas. A referência
cultural do Rio é ativo para questões econômicas, sociais e até de
segurança pública”.
USO DA RUA PARA MANIFESTAÇÕES CULTURAIS

REABERTURA DO MUSEU DO CARNAVAL
“O Museu faz parte dessa política de reforçar as principais
referências da cidade. Vamos devolver um símbolo importante para cidade.
É mais que reabrir o espaço. São dois momentos: o primeiro que não é o
ideal, mas urge que seja aberto já. Esse espaço é pequeno para o
universo que é o carnaval do Rio. Por isso, eu digo que é uma primeira
etapa, quase que simbólica. A previsão de abrir é em abril, porque hoje o
Museu virou depósito. Podemos mostrar a escola campeã. O carnaval
precisa estar de janeiro a janeiro sendo visitado. Trabalhar a memória e
patrimônio da cidade. Tem um histórico que parte do acervo foi para
Liesa, mas não tenho a confirmação dessa informação. Hoje, o espaço tem
paredes degradadas. Teremos que fazer uma obra interna. Queríamos abrir
em janeiro, mas esbarramos nos usos do espaços que já estavam alinhados.
Fizemos o exercício da narrativa que colocaremos no Museu. Terá
exposição, uma parte interativa, ainda não do tamanho que pensamos, e
estamos ouvindo muito as pessoas, sambistas e não sambistas, para saber o
museu que as pessoas querem”.
FONTE:CARNAVALESCO
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